29 de março de 2011

'A Fita Branca', ou o ovo do ovo da serpente

A Fita Branca (Das Weisse Band), filme de Michael Haneke, continua uma ótima indicação do bom cinema europeu, apesar de já ser de 2009. Haneke, responsável pela direção e roteiro, é formado em psicologia, filosofia e teatro pela Universidade de Viena, e suas produções têm como marca o debate da violência e das perversões humanas. Violência Urbana, A Professora de Piano e Caché também tiveram direção dele.

Em A Fita Branca, às vésperas da I Guerra Mundial, estranhos eventos abalam a calma de um vilarejo protestante no norte da Alemanha. Uma corda estendida como armadilha derruba o cavalo do médico do lugar (Rainer Bock), um celeiro pega fogo, duas crianças são sequestradas e torturadas... Os incidentes isolados vão ganhando forma de um cruel ritual de punição, pondo a cidade em pânico. O professor (Christian Friedel) do coro de jovens investiga os acontecimentos em busca do responsável, querendo revelar a perturbadora verdade, ainda que admita não distinguir exatamente o que seja boato ou não. A frieza e a culpa coletivas são narradas por este personagem central, ao longo de um filme em preto e branco de rica fotografia e com enquadramentos primorosos, mesmo em ambientes internos e de planos fechados.

Aquele microcosmo, com seu sistema social rigidamente hierárquico e de enorme intransigência moral, reserva sempre severas punições às crianças e mulheres, sob o domínio inconteste dos adultos homens. Mas o que em público tem aura de justo ou adequado, a quatro paredes revela sua mais pura crueldade. Nesse clima, a notícia do assassinato, em Sarajevo, do arquiduque austríaco Francisco Ferdinando, que desaguará na carnificina da primeira grande guerra, impõe um corte ao silêncio que pauta a coletividade perante os sinistros acontecimentos locais.

Palma de Ouro do Festival de Cannes de 2009, A Fita Branca (144 min., prod. Áustria, França, Alemanha e Itália) busca retratar o ponto germinal do crime de ódio mais abordado pelo cinema no século 20, o Holocausto. Naquele ambiente social rígido e autoritário, pleno em punição, puritanismo, crueza e disciplina – e que ainda sairia profundamente massacrado pelos vencedores do primeiro conflito bélico mundial –, estava sendo germinado com muito rancor o ovo da nazi serpente a gerar a II Guerra.

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